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Velhas tecnologias e (velhas) formas de ensinar

Mary Grace Andrioli
Escrito por Mary Grace Andrioli em setembro 9, 2012
10 min de leitura
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Republicação do Blog Eu amo Educar – Atica Scipione

As tecnologias estão cada vez mais presentes no cotidiano da escola. A cada dia uma inovação: tablets, lousas digitais, netbooks e com isso novos materiais sempre com uma promessa de maior interatividade para melhorar a educação.

Mimeógrafo? Há professores da nova geração que nunca viram um e  há os que  fazem careta, dizendo que este recurso está ultrapassado. Será? Cada vez mais fico convencida de que ultrapassada mesmo está a nossa forma de trabalhar, mas alguém tem que ser culpado e nada como culpar um objeto ou a falta de recursos, quando não temos toda a pirotecnia do século XXI.

Quando eu lecionava, havia um recurso ainda mais desconhecido pelos professores, chamado episcópio. Este aparelho, pouco utilizado era uma herança das escolas estaduais e havia em algumas escolas municipalizadas. Gostava muito de utilizar este recurso para compartilhar as produções dos alunos e discuti-las coletivamente. 

Era só colocar a produção na máquina e projetá-la na parede. Vejam a imagem a seguir, para ter uma ideia do tamanho do aparelho:

Episópio
Fonte: Episcópio 4paper

O aparelho era bastante pesado e dava um certo trabalho carrega-lo até a sala. Fora isso era preciso deixar o local bem escuro para que funcionasse bem. Mas valia muito a pena!

Sempre que os alunos faziam produções de texto, por exemplo, escolhia algumas produções e todos da turma tinham que deixar contribuições para melhorá-la. Também tinham que destacar o que achavam mais interessante na produção.

Depois todos os alunos refaziam seus textos e discutíamos novamente os avanços. A discussão coletiva, muitas vezes contribuía não apenas com a produção que estava sendo analisada, mas trazia elementos para que cada aluno melhorasse seu próprio texto.

Muitas vezes comparávamos também o antes e o depois.

Um recurso mais conhecido com semelhante função é o retroprojetor. Porém esse geralmente depende da produção de slides feita pelo professor, tornando a aula mais expositiva. Na minha turma, os próprios alunos sabiam manusear o episcópio e adoravam.

Quando não faziam lição de casa, sentiam muito na hora que viam os outros alunos apresentando suas produções para a turma no episcópio. Alguns até pediam para fazer algo na hora para que pudessem participar também da apresentação.

Outro recurso bastante curioso e que sobreviveu muito tempo na escola e ainda sobrevive em muitas é o mimeógrafo. Eu cheguei até a comprar uma impressora matricial para facilitar a elaboração de aulas na época, afinal não tínhamos cotas de xérox, nem livro didático para cada aluno e não dava para depender apenas da lousa.

Sempre achei importante que os alunos tivessem mais tempo para pensar e pensar não significa fazer cópias e mais cópias do quadro. O mimeógrafo de certa forma poupava os alunos disso e permitia compartilhar com eles alguns textos e atividades.

O uso mais significativo do mimeógrafo que conheci, foi citado no livro “A paixão de conhecer o mundo” da Madalena Freire. Em vez da professora “passar atividades” para os alunos, ela propunha que eles criassem atividades e rodassem para toda a turma. 

Ora! É possível sim desenvolver atividades com sentido social e envolvendo os alunos como protagonistas mesmo usando um mimeógrafo! Quantas coisas poderiam mais ser feitas com um recurso tão simples e de baixo custo?

O pedagogo Freinet (1896-1966) produzia jornal com os alunos utilizando a prensa escolar, engajando as crianças na produção de algo significativo e que as motivava para aprender. As crianças compunham os textos, discutiam e faziam a edição em pequenos grupos. Ora, era mais difícil produzir jornal dessa forma do que com uma máquina de escrever e não fazemos isso direito nem mesmo com o computador hoje em dia!

Fonte: https://image.slidesharecdn.com/freinetc-ojornalescolar

Não há dúvidas de que hoje é tudo tão mais fácil e rápido, sem contar a qualidade da apresentação e potencial de socialização não somente dentro da escola, como por meio da web.

Hoje temos no lugar do episcópio, a câmera de documentos. Esse foi um recurso que  conheci na faculdade, mas que era usado de forma tradicional pelos professores, ou seja, geralmente sempre estes é que apresentavam algo para os alunos.

Agora com impressoras, Datashow, lousa digital, netbooks que tipo de atividades estamos promovendo? Sem dúvida estas tecnologias apresentam um potencial de inovação muito grande, mas sozinhas são incapazes de transformar a educação.

No próximo post falarei destas tecnologias e o que temos feito. Vale a pena pensarmos antes em inovações que fazíamos antes destas tecnologias. Nesse aspecto os mais velhos tem muito o que contribuir e pensar… o que fazíamos antes, que princípios pedagógicos tínhamos e que podemos aproveitar com as novas tecnologias? O que nos impede de inovar atualmente quando temos recursos? E o que nos impede de inovar quando não temos tantos recursos assim?

Algumas (velhas) formas de ensinar já seriam inovadoras se fossem colocadas em prática atualmente, com as tecnologias que dispomos!

Texto originalmente publicado em 2012 no Blog Eu Amo Educar – Editora Ática Scipione. Recuperado pelo site Webarchive: https://web.archive.org/web/20120103202937/http://blog.aticascipione.com.br/author/marygrace